das ordens

Há aqui um puto ao lado que me dá ordens enquanto ouve música no iPod: dança! e eu danço.
Acabei de vir do cabeleireiro com o corte de cabelo que a miúda encomendou - igual a ela, note-se!
O do meio conseguiu reverter um castigo porque hoje se portou tãããooo bem e faz questão de bater as pestanas quando o diz.
E estamos aqui os 4 num sofá, alinhados.

São uns crominhos que mandam em nós. Fraquejamos um minuto e estamos a fazer tudo o que querem e pior, conseguem-no tão bem que nos convencemos de que o fazemos porque queremos, não porque cedemos constantemente às suas vontades. Eu cedo muito, vivo iludida de que não o faço, mas cedo bastante. Acho que cedemos todos. Pomos a armadura da intransigência mas eles dão cabo dela com uma destreza digna de político.

Não sei bem onde ficam as nossas vontades. Dispersam-se na massa que quiserem jantar em vez de salmão no forno. Difundem-se nas cores dos desenhos animados que nos tiram o tempo de uma série que antes não perdíamos por nada. Derretem-se no morno dos abraços. Fico a pensar se me deveria sentir completamente dominada em vez de envolta como me sinto. Eu faço-lhes as vontades nas coisas mais simples e não posso perder de vista a linha ténue que separa o mimo da má educação. Morro de medo de já a ter perdido e de um dia tudo isto se virar contra mim, ou pior, contra eles.

Sei que algumas das vezes em que perco a cabeça é pela frustração de eles não entenderem algumas coisas, e uma delas é precisamente a dificuldade com que lidam com a frustração. O não conseguir, o não ter, o não ganhar. Preciso de pequenos truques e vou escreve-los na mão tipo copianço. Vou ser firme nas minhas intenções de os fazer crescer saudáveis. Mas sou tão mais firme na intenção de os ver felizes...

Já nem falo dos dias em que com a cabeça em água dizemos que sim a tudo, nem ouvimos a pergunta ou pedido e passamos-lhes para as mãos qualquer coisa idiota como um martelo ou dizemos que sim, que podem ir pintar o sofá de azul ou cortar-nos o cabelo. Nesses dias estamos desculpados, temos que poder dar umas faltas nesta coisa complicada que é estar pronto para tudo a qualquer hora.
Falo dos dias em que deliberadamente lhes dizemos que sim, porque sim. Em contrapartida daqueles em que dizemos que não (e aí não falha questionarem-nos do porquê... criaturas espertas!)

Falo dos dias como o de hoje, de momentos como os de agora, em que jantados, lavados e prontos para ir para a cama, os deixo desbundarem e fazer da sala uma arcade. E sonho com a promessa de um beijo repenicado porque hoje vão dormir sem lhes ter gritado, sem lhes ter negado, sem os ter questionado. É, hoje troquei a educação pelo beijo repenicado e as mãozinhas pequenas que agora me fazem escrever só com uma mão.

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